WE HAVE BEEN AT – DIÁRIO DE BORDO | 3ª Crónica

Dia 3 do relato de uma viagem à Arábia Saudita, realizada por António Cruz e Ana Fialho, dois apaixonados por conhecer o Mundo e os seus recantos ainda pouco visitados. António, economista e Ana, professora, aproveitam todos as suas férias nesta exploração. Culturas diferentes, interação com os locais, gastronomia e fotografia são as suas preferências nestas descobertas.

Dia 3 – 24 dezembro 2023

Início de dia bem cedo, porque hoje vamos visitar os nabateus.

Pequena almoço numa padaria, com pão fresco, acabadinho de sair do forno. Comido mesmo sem mais nada, com um sumo de ananás fresco. Uma delícia de pequeno-almoço, por apenas 1 €, para duas pessoas.

Tour para visitar a cidade de Hegra, 2ª cidade mais importante dos nabateus. Transfer em autocarro da cidade de Al Ula para Hegra. À chegada, welcome drink e frutas desidratadas. Guia local e transporte automóvel para os pontos de visita. Sempre água distribuída ao longo das duas horas de tour e, no final, mais umas frutas desidratadas, deliciosas por sinal. Uma visita que teve um serviço fantástico, com um valor por pessoa de 95 SAR, cerca de 24 €, substancialmente mais barato que Petra, a cidade mais conhecida dos nabateus, e que se localiza na Jordânia. Transfer de regresso ao ponto de partida, em Al Ula.

Quanto à antiga cidade nabateia, uma parte importante ainda está em escavações, mas já se podem visitar a maioria dos túmulos esculpidos na rocha. Na rota de visita, figurantes vão aparecendo na paisagem. Para quem já visitou Petra, o serviço é completamente diferente. Vendedores ambulantes não há, nem ofertas de serviços extras, uma vez que está tudo excelentemente bem organizado.

Aliás, venda ambulante é algo que não se vê no país. Nem nas zonas agrícolas se encontram as comuns bancas de venda de produtos. No ponto oposto estão os radares, que são pragas! Ou se vai com muita atenção aos limites, ou é foto na certa. Já passámos por algumas dezenas, e creio que sempre dentro dos limites. Logo veremos se um dia destes, teremos notícias em Portugal da polícia saudita.

Paragem para almoço num restaurante de camionistas. Como em qualquer país do mundo, normalmente os melhores! E este não foi exceção. Com pena nossa, as boxes de comer no chão estavam todas ocupadas e colocaram-nos numa mesa. Por um manjar de reis, quer na quantidade quer na qualidade, um divinal frango com arroz, servido a preceito local, com cebola e pimento verde crus e limão, pagámos a “loucura” de 7,50 € para os dois. Continuamos na nossa senda Pepsi, que aqui álcool…não há. Comido da forma tradicional, no chão, teria sido um ponto alto da viagem.

Uns quilómetros à frente, um saudi pedia boleia. Claro que parámos e começou a odisseia de nos entendermos. Percebemos logo de início que queria ir para Medina, e isso era fantástico uma vez que era o nosso destino final do dia. Mas falava, falava, falava e não entrava. De inglês nem uma palavra. Depois gestos, abrindo e fechando as mãos. Até que finalmente conseguimos perceber que queria pagar e estava a dizer o valor que podia despender. Quando por fim entendeu que não íamos cobrar nada, entrou de imediato todo sorridente.

Ainda tentámos o diálogo, mas foi algo impossível. Ao princípio ficou meio apreensivo, porque tinha acabado de entrar num carro de estrangeiros, que não lhe cobravam nada pelo transporte e onde voavam mapas desdobrados, ao mesmo tempo em que vídeos eram filmados e a música subia de volume para a banda sonora. Mas percebeu estar em boas mãos, relaxou e passou 250 km a dormir que nem um bebé. Nem o nome dele soubemos e no final “Shukran! Shukran! Shukran!”.

Hoje o aluguer do quarto de hotel foi à primeira, sendo apesar de tudo algo estranho. Na Booking confirmámos haver pelo menos um quarto. Fomos à receção e dizem-nos que estavam cheios…, mas que tinham vagas via booking… ao balcão queriam 300 SAR, e marcámos na receção via Booking por apenas 211 SAR. Não podiam fazer nada disseram os empregados. Muito estranho, mas regras são regras. Podiam ter recebido 211 SAR limpinhos e assim ainda vão levar com a comissão.

Em Medina, impossível não visitar a imponente Mesquita Al-Masjid-an-Nabawi, uma das maiores do mundo e onde o profeta Maomé está sepultado. Foi originalmente construída pelo profeta Maomé no ano de 622, e foi a terceira mesquita construída ao longo da história do Islão. É o segundo local mais sagrado desta religião, sendo que o primeiro é a Grande Mesquita de Meca. Está aberta 24 horas por dia. Na sua construção original, a mesquita ocupava uma área de 30,5 m por 30,5 m, sendo que atualmente tem mais de 400.000 m². Não sendo muçulmanos, não pudemos entrar, e apenas circular nos pátios exteriores, gigantescos. Impressionante os milhares de pessoas, vindas dos quatro cantos do mundo, que se encontravam no espaço religioso, dentro e fora da mesquita.  Segundo soubemos, às sextas-feiras ainda tem mais pessoas e já estavam muitos e muitos milhares. Por todo o lado constroem-se hotéis colossais, a juntar às várias dezenas que já existem na zona da mesquita. Mais uma cidade estaleiro, com dezenas de obras a decorrer, certamente dentro do projeto Vision 2030. De repente, e pela primeira vez, um senhor muito simpático dirigiu-se a mim esticando a mão para me cumprimentar e para me dizer ser importante a Ana tapar a cabeça. Como a Ana estava com traje local, foi só colocar o barrete do fato e questão resolvida. Sempre a sorrir durante toda a conversa, ele deu-me um beijo e continuou a sua viagem. Na realidade, em milhares de pessoas que ali se encontravam, não se viu uma mulher com a cabeça destapada. Não sendo obrigatório, acaba por ser uma forma de respeitar a cultura.

Entretanto hora de jantar. Para nossa surpresa, uma barraquinha vendia Kunafa, um doce fabuloso que comemos desalmadamente na Jordânia. É feito de uma massa fina, tipo aletria, misturado com queijo e frutos secos. Claro está que tirámos a barriguinha de miséria. Foi o nosso bolo-rei da ceia de Natal. Amanhã é sentido sul, com paragem algures a meio caminho de Abha, porque até lá são 1000 km.

Mas o dia ainda não tinha terminado e na realidade terminou da melhor forma. O diretor do hotel veio meter conversa connosco, e acabou por nos convidar para ir visitar uma mesquita, segundo ele, a mais importante e bonita de Medina, principalmente à noite. Aceitámos, e na realidade a mesquita – Quba – é lindíssima, sendo a primeira mesquita construída do Islão. Existe desde 622, e foi construído pelo profeta Maomé, quando imigrou de Meca para Medina.

Fomos beber um chá tradicional de Medina a convite dele, uma mistura de hortelã e folhas de rosa, entre outras ervas, bastante bom, e acabámos por ir ficando na conversa. A vida por aqui é muito diferente, principalmente a nível económico. Ele ficou muito admirado quando lhe dissemos os impostos que pagávamos. Aqui as pessoas não pagam nenhum tipo de imposto, e a educação e saúde são totalmente gratuitas. Riu-se quando lhe falei pagarmos portagens. O salário mensal mais baixo do reino são, ao câmbio atual, 1.000 €, e o médio 2.500 €. Um professor ganha 3.500 € e um médico pode facilmente chegar aos 25.000 €. Ele é diretor de hotel e tem um jipe GMC, onde andámos, totalmente equipado para expedições no deserto, incluindo cozinha. Tem um girocopter, um ultraleve, um buggy, 4 filhas… ficámos a saber tudo isto porque, tal como eu, é um entusiasta de arqueologia e voa bastante para descobrir construções antigas, mais visíveis do céu e faz grandes expedições no deserto em busca de gravuras nas pedras. O reino, em termos arqueológicos é um mundo por descobrir. Passámos um bom tempo a ver as suas fotos, grande parte delas aéreas e lindíssimas. Ainda soubemos que o governo saudita custeou a estadia dele um ano na Nova Zelândia, para aprender inglês. O investimento no turismo está mesmo a ser muito forte. O caminho a percorrer ainda é longo, e por aqui inglês é língua perfeitamente desconhecida, mesmo em locais exclusivamente turísticos. Foi um final de noite em companhia excelente, com uma conversa fantástica, e um amigo que fica. “Brothers”, como ele disse. Ficou o convite para voltarmos e fazermos umas expedições em conjunto. Nunca se sabe…

@we.have.been.at we.have.been.at@gmail.com

 

  • Diário de Odivelas - Redação

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