
Quarta crónica de uma viagem à Arábia Saudita, realizada por António Cruz e Ana Fialho, dois apaixonados por conhecer o Mundo e os seus recantos ainda pouco visitados. António, economista e Ana, professora, aproveitam todos as suas férias nesta exploração. Culturas diferentes, interação com os locais, gastronomia e fotografia são as suas preferências nestas descobertas.
Arábia Saudita dias 4 e 5 – 25 e 26 dezembro 2023
Dia de Natal que começou lindamente com um pequeno-almoço de pita, com tudo aquilo a que tínhamos direito: falafel, ovo cozido, batata frita, maionese, couve roxa e beringela grelhada. Uma explosão de sabores! Nem vos digo o preço… deve ter sido 0,50 € para dois, incluindo o indispensável chá.
De volta à estrada, para mais uma tirada de quase 500 km, entre Medina e Al Taif. No posto de combustível os empregados desejam “Merry Christmas”. Pelo caminho, as famosas câmaras de velocidade. Dezenas e dezenas. Inacreditável! É preciso conduzir com uma atenção diabólica à sinalização. Não ter uma multa será só porque Jesus, Maomé, Buda e mais alguns, se juntaram e decidiram poupar-nos.
Check point minucioso na auto-estrada e antes de Meca, de acesso proibido a não muçulmanos. Carta de condução internacional, passaporte, e telemóvel para ver o caminho que íamos seguir no GPS, que o polícia percebeu estar ligado. Mas sempre muito simpático! Até soube dizer António. Terminou com um agradável e verdadeiro “welcome”. Hoje calhou-nos duas paragens por autoridades. A segunda muito mais rápida uma vez que o polícia assim que percebeu que éramos de fora, apenas perguntou qual o país, e o nome de Portugal aqui é de imediato sinal de largo sorriso, a que o CR7 não deve ser alheio. Mandou avançar com um “welcome”, sem mais demoras!
Almoço de Natal num típico restaurante saudita, com boxes familiares e onde se come no chão, e de uma mesma travessa. Ser português, implica obrigatoriamente Ronaldo e isso leva de imediato a oferta de um caril de vegetais para acompanhar o frango com arroz, delicioso por sinal. Doses gigantescas, o que fez muito felizes dois gatos, que se banquetearam com partes mais secas do frango. Durante o almoço recebemos nos telemóveis uma mensagem da proteção civil, mas escrita em árabe. Não conseguimos tradutor para a mesma. Uns não falam árabe, e os que falam, não falam inglês. Mas conseguimos minimamente perceber ser um alerta para dia 29 com previsões de chuva forte, na zona de Medina e Meca. Nesse dia já estaremos a milhas. O restaurante ficava mesmo no sopé de uma alta montanha, e no mapa a estrada via-se bastante sinuosa, e estradas de curvas é comigo. Afinal era bastante tranquila, porque até em alta montanha conseguiram fazer uma estrada de duas faixas para cada lado. Tem uns ganchos excelentes, e a vista é mesmo fabulosa.
Paragem em Al Taif, para descanso dos viajantes, cidade de montanha, a 1.700 m de altitude. É conhecida pela qualidade da sua água de rosas e pela produção de romãs e figos. O teleférico estava fechado, mas a viagem deve ser impressionante pela paisagem circundante. Aproveitámos para conhecer o mercado antigo da cidade, onde ainda se faz certamente a maior parte do comércio. Dezenas de lojas que vendem de tudo um pouco. Paragem para um chá, que acabou por ser oferta de um cliente, que fez questão de oferecer. A hospitalidade deste povo tem sido notável e é certamente algo de que não nos vamos nunca esquecer. Amanhã serão mais 500 km de estrada.(fim dia 25)
Hoje o percurso acabou por ser dividido. São as vantagens de se viajar sem nada marcado, o que nos dá muita liberdade de improviso. Em vez de 500, dividimos o percurso em 2 e acabámos por ficar em Al Bahah, em plena montanha, a quase 2.000 metros de altitude.
Para o dia de hoje tínhamos uma missão: trocar uma nota de 500 SAR, cortada num dos cantos e que por duas vezes os comerciantes recusaram aceitar. Descobrir um banco no caminho não foi fácil, mas quase a chegar ao destino, eis que surge finalmente a tão desejada instituição. Para entrar…um filme! Um diligente segurança insistia em que tínhamos de tirar uma senha e escrever o número de conta num monitor. Inglês…népias! Até que por fim, uma troca de olhares com um funcionário numa secretária fez-nos entrar. Explicámos, e em 1 minuto ficámos com o problema resolvido. Missão cumprida!
E segue estrada para Dhee Ayn, evitando os macacos que atravessam a via. Dhee Ayn é uma aldeia histórica completamente reconstruída para fins turísticos, lindíssima, e numa cota muito mais baixa que Al-Bahah. Na realidade é um fértil oásis, uma vez que brota uma nascente de água, que dizem os mais velhos, pelo menos durante os últimos mil anos nunca secou. A estrada que desce para o vale é fabulosa, e é uma obra de engenharia complexa de túneis e viadutos a acompanhar a montanha. Em meia hora de descida a temperatura subiu 15 graus. Desta vez, estrada apenas de um sentido para cada lado. Camiões no percurso dificultam o andamento, uma vez que é proibido ultrapassar nos 25 km de descida. Mas na Arábia Saudita, fazemos como os sauditas. Nas pequenas retas, se dá para passar…passa-se! A minha “copiloto” é que resmungou muito…
Almoço num restaurante local, sentadinhos no chão, e outra vez frango! Muito frango se come neste país. À saída, um grupo de homens, que animadamente comia à volta de uma travessa gigante, mete conversa connosco. De onde somos, para onde vamos, de onde vimos, se estamos a gostar, etc. Por fim, um deles questiona se precisamos de alguma coisa que eles ajudam e terminam com um vigoroso “Welcome”! Esta hospitalidade é algo a que não estamos habituados, e só a conseguimos compreender vivenciando. Nesse campo a Arábia Saudita tem sido uma surpresa muito, mas muito agradável, porque se nota que as pessoas querem mesmo que fiquemos com boa impressão das gentes e do país.
Voltando à aldeia de Dhee Ayn, na lista de candidatos a Património da Unesco, começámos pelo Centro de visitantes, onde fomos muito bem recebidos por um jovem, que apenas arranhava inglês e que nos deu deu uma explicação do que podíamos ver no centro e na aldeia. A visita é grátis. O centro, muito agradável, tem um minimuseu e a história da aldeia que remonta ao tempo das caravanas, vindas do Iémen, que por aqui passavam para descanso e reabastecimento. Perto da nascente de água, uma banca de chá e de flores de um Bangla, onde já estavam dois Saudis, e lá partilhámos mais umas histórias do local, ao sabor de um maravilhoso quente chá-verde com hortelã. Entretanto aparece o dono da banca, que gentilmente corta uma flor de um vaso e oferece à Ana, dizendo “Welcome”! Mais uma vez a atenção destas pessoas é fabulosa. Depois da visita regresso ao centro de visitantes, agora já com 2 rececionistas. Muito atenciosos, questionaram se tínhamos gostado e qual as melhoras que podíamos sugerir. Dei duas sugestões que eles acharam muito interessantes, via tradutor do Google. Estava a ver que acabava contratado como consultor. Acabámos a conversa no futebol, Cristiano Ronaldo e Jorge Jesus, este último que me parece ir ficar aqui para a história, pelos bons resultados que está a alcançar. Também me questionaram se eu era irmão do Rui Vitória, porque, segundo eles, sou muito parecido. Ainda nos deram 4 garrafas de água fresca, tirámos fotos, enfim, mais um exemplo do cuidado e da atenção ao visitante. Não é fácil encontrar isto noutros locais do mundo.
Tudo o que desce sobe, e Al-Bahah fica mais alto que Dhee Ayn, logo, a estrada tem de voltar a ser palmilhada. Mais uns resmungos da “copiloto”, mas felizmente só apanhámos dois camiões. Reserva do hotel na cidade sem nenhum problema e novo filme com o rececionista, que de inglês… nada! A sorte é que já sabemos os números em árabe. Desta vez até tiveram de telefonar para alguém, para falar connosco. Felizmente o funcionário da limpeza, indiano, lá arranhava qualquer coisa e tudo correu bem, com contrato de alojamento assinado e tudo. Passeio pela cidade e amanhã mais 300 km até Abha, numa viagem prevista de mais de 5 horas, maioritariamente em montanha.
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