Sociedade & Ambiente | O contributo da Universidade Sénior para a Sociedade do Conhecimento

«Ninguém é tão grande que não possa aprender, nem tão pequeno que não possa ensinar».

Pindare (521-441 A.C.)  – Poeta lírico grego

Numa altura em que o “inverno demográfico” se acentua em Portugal – as pessoas com 65 e mais anos de idade já representam 23,4% da população portuguesa-  e quando é reforçado o apelo ao envelhecimento ativo e saudável, definido pela Organização Mundial de Saúde como o «processo de otimização das oportunidades para a saúde, participação e segurança, para melhorar a qualidade de vida das pessoas que envelhecem», nada melhor que trazer aqui o exemplo do dia a dia vivido pelos alunos de uma qualquer universidade sénior, local onde a troca de conhecimento e partilha de saberes é uma constante diária.

Fonte:  https://www.usenior-odivelas.com/  Facebook_USO

 Portugal enfrenta hoje um “duplo envelhecimento” provocado, sobretudo, pela diminuição da natalidade e aumento da longevidade, esta uma conquista social e civilizacional que nos deve encher de orgulho.

Segundo o Instituto Nacional de Estatística, no triénio 2021-2023, em Portugal, a esperança de vida dos homens fixou-se em 78,37 anos e a das mulheres em 83,67, o que representa um aumento de 1,14 anos para o total da população na última década. Note–se que, em 1970, apenas 9,7% da população residente em Portugal tinha 65 ou mais anos.

Se a “velhice” – uma categoria socialmente construída -, e “envelhecer”, é algo natural e inevitável, aumentar a expectativa de uma vida saudável e assegurar boa qualidade de vida a todos os idosos, deverá ser como sociedade o nosso grande desígnio.

É uma etapa da vida onde a pessoa mais “velha” pode desenvolver todo o potencial que ainda reserva dentro de si transmitindo-o às novas gerações – envelhecimento bem-sucedido -, pelo que é indispensável reconhecer e valorizar toda essa experiência e “sabedoria prática” (Aristóteles, 322 a.C.) acumulada com o passar dos anos.

 «Não somos providos de sabedoria, devemos descobri-la por nós próprios, depois de uma longa viagem pelo ‘deserto’, que ninguém nos pode tirar, e de que nenhum esforço podemos ser poupados»

(Marcel Proust,1919).

Nesse sentido incluímos a “aprendizagem ao longo da vida no ensino sénior, um conceito que, para além do benefício do novo conhecimento que recebe, o aluno tem a oportunidade de partilhar todo o seu saber e experiência adquirida ao longo do seu percurso pessoal e profissional, num ambiente saudável, participativo e informal.

São diálogos e troca de saberes enriquecedores, que, ao romperem com a hegemonia do pensamento curricular, vêm legitimar outras formas de conhecimento, num exercício a que se chama “Ecologia de Saberes” – o encontro do conhecimento científico com saberes de experiência feita, saberes populares, costumes e tradições.

Como é amplamente reconhecido, há muito conhecimento válido na sociedade, fora da esfera académica.

Não é por acaso que ao longo da história do desenvolvimento humano, o indivíduo tem procurado sempre a sabedoria, podendo dizer-se que esta é o pináculo do desenvolvimento humano.

É este o pensamento que levou ao crescimento das universidades seniores, aliado ao facto de ser um excelente meio para manter a vida ativa de quem já tem caminho feito, algo de capital importância nesta fase da vida.

Trata-se de um espaço onde os alunos podem não só aprender e atualizar conhecimentos, mas também conviver e, sobretudo, manterem-se socialmente ativos. Novos compromissos e novas amizades vão contribuir para o seu bem-estar físico, mental e social.

“O homem é um animal social”, já defendia o filósofo Aristóteles quando se referia ao facto de o ser humano precisar de estar em sociedade para viver plenamente.

Afinal o envelhecimento ativo, positivo e saudável constrói-se em cada dia das nossas vidas.

Ora, desde iniciativas culturais, recreativas e desportivas até ações de solidariedade social e de lazer são muitas as atividades oferecidas por estas universidades aos alunos.

De acordo com a RUTIS (Associação Rede de Universidades da Terceira Idade), existiam em 2020, 368 universidades seniores, com cerca de 65 000 alunos e 7 500 professores em regime de voluntariado.

Em suma, tratam-se de instituições que, para além de espaços de aprendizagem e de transmissão de conhecimento, promovem o envelhecimento ativo e saudável, fechando as portas à solidão e ao isolamento social, o atual grande flagelo das sociedades modernas.

Como defende a comunidade científica, manter a aprendizagem e a criatividade nesta fase avançada da vida contribui para o aumento da perceção subjetiva de saúde e estimula a capacidade cognitiva e psicológica dos idosos, sendo uma das melhores estratégias para evitar o aparecimento de doenças degenerativas do cérebro.

De igual modo, continuar envolvido ativamente com a vida (“reformei-me, mas não deixei de trabalhar”, “detesto a rotina”, “tenho tempo agora para fazer coisas novas que não consegui fazer anteriormente”) e sentir-se bem consigo próprio, são duas dimensões que elevam a autoestima, a autonomia e a confiança do indivíduo e fazem aumentar o sentido de pertença e a satisfação com a vida.

Podemos, pois, afirmar que estas instituições são, em simultâneo, uma resposta social e educacional, onde a convivência, a entreajuda e o voluntarismo caminham lado a lado com a aprendizagem contínua, pois nesta sociedade do conhecimento e da informação o processo de educação terá que ser permanente e ao longo de toda a vida, conforme antecipou, em 1993, Jacques Delors, ao identificar os quatro pilares da educaçãoaprender a fazer; aprender a conviver; aprender a ser; aprender a aprender”.

Com efeito, a educação faz-nos transitar do passado, enquanto memória que se atualiza no presente, para o futuro que antecipa e projeta o novo, o imprevisto.

«Ninguém escapa da educação (…) somos seres humanos não porque somos racionais, mas porque aprendemos e somos seres de sentimento, de consciência reflexiva porque sabemos que sabemos e sentimos que sabemos. E somos seres de aprendizagem que aprendemos a dar sentido ao que sentimos e sabemos»

(Carlos Brandão,2007).

Afinal só envelhece quem quer!

Carlos de Jesus

Licenciado em Sociologia. Mestre em Ecologia Humana

Email: carlos.jesus@campus.fcsh.unl.pt

Facebook: Eu combato o Desperdício Alimentar

  • Diário de Odivelas - Redação

    Related Posts

    O armário dos contos | “O contador da história” na Comuna

    Se há contadores da água, da luz, do gás, porque não haverá um armário cujas gavetas abertas deixam contar histórias da nossa História, a deste país que, para «quem vem…

    “Monóculo, retrato de S. Von Harden” no Teatro Aberto

    Continuo a fascinar-me com os atores, pelo menos com alguns deles. Porque o ator é um travesti, um transformista, dá a voz e o corpo, a máscara a cada nova…

    Deixe um comentário

    O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

    Publicidade

    Carla Fonseca lança livro infantil este sábado

    Carla Fonseca lança livro infantil este sábado

    PSP deteve dois homens na Pontinha por suspeita de tráfico de estupefacientes

    PSP deteve dois homens na Pontinha por suspeita de tráfico de estupefacientes

    Sociedade & Ambiente | Só uma economia verde salvará o Planeta e a Humanidade

    Sociedade & Ambiente | Só uma economia verde salvará o Planeta e a Humanidade

    O armário dos contos | “O contador da história” na Comuna

    O armário dos contos | “O contador da história”  na Comuna

    Mais de mil escuteiros, em Odivelas, no Festival Nacional da Canção Escutista

    Mais de mil escuteiros, em Odivelas, no Festival Nacional da Canção Escutista

    Conversas Com Alma – edição de 10 de novembro

    Conversas Com Alma – edição de 10 de novembro